O assunto nunca esteve tão em pauta entre
síndicos, administradores e condôminos. Na busca pela economia na conta de
água, a medição do consumo por unidade tem sido a saída adotada por muitos
condomínios.
O
consumo de água é um dos maiores vilões do condomínio. Na verdade, a conta de
água representa a segunda maior despesa dos condomínios, só perdendo para a
folha de pagamento somada aos encargos e obrigações trabalhistas. Além de pesar
no bolso, o gasto excessivo de água deve ser combatido por representar uma
questão de sobrevivência da humanidade. Não faltam dados para mostrar que a
água é um bem finito. Segundo um relatório coordenado pela Unesco (Organização
das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), se medidas urgentes não
forem tomadas para implementar o uso racional dos recursos hídricos, até 7
bilhões de pessoas poderão conviver com a falta de água no ano 2050. Como
resolver essa triste equação?
Para
Aurélio Nomura, vereador da cidade de São Paulo, são essenciais o incentivo à
economia e ao reuso da água, o aumento da captação da água de chuva e a
ampliação da rede de tratamento de esgoto. Ele também acredita, porém, que a
medição individualizada em condomínios é um dos caminhos para solucionar a
crise no abastecimento de água. “Ela é perfeitamente viável inclusive nas
construções antigas. Um levantamento da Agência Nacional de Águas estipula o
retorno do investimento entre 10 a 24 meses”, afirma. Aurélio é o autor da Lei
14.018/2005, já aprovada mas não regulamentada, que institui em São Paulo o
Programa Municipal de Conservação e Uso Racional da Água em Edificações. A lei
prevê a instalação de hidrômetros individuais nas unidades das edificações
novas e dá um prazo de 10 anos para as construções antigas se adequarem. São
Paulo, assim, acompanha cidades como Recife, Vitória, Niterói e Curitiba, que
já têm suas legislações sobre o assunto.
Nomura
enumera alguns dos resultados obtidos em prédios que optaram pela
individualização: redução da despesa de água e de energia elétrica (já que
diminui o volume de água a ser bombeado no prédio), melhor possibilidade de
identificação de vazamentos, redução da inadimplência e do volume de esgoto
produzido pelo prédio. Em prédios novos, ainda segundo o vereador, um projeto
hidráulico prevendo a medição individualizada pode economizar até 25% no custo
da construção.
Em
São Paulo, prédios recém-entregues na Mooca pela CDHU (Companhia de
Desenvolvimento Habitacional e Urbano) dispõem de medição individualizada de
água, energia e gás pela tecnologia PLC (Power Line Comunication). Além da
medição dos consumos, essa tecnologia permite que sinais de telefonia digital,
TV a cabo e internet caminhem pela rede elétrica. “Hoje a leitura da água é
feita a distância, na Eletropaulo. Não há necessidade de entrar um leiturista
no prédio”, afirma Raphael Pileggi, secretário executivo do Qualihab, comitê de
qualidade da CDHU, completando que o sistema representou uma economia de 16% no
custo da instalação elétrica dos edifícios.
O
sistema PLC é uma das tecnologias mais inovadoras quando se trata de medição
individualizada de água. As informações dos hidrômetros instalados nos
apartamentos são transmitidas pela mesma fiação da rede elétrica a um
equipamento instalado na área comum. “Os sistemas de medição remota, como o
PLC, diminuem um grande problema da individualização, que é o da leitura. Não
adianta instalar um hidrômetro que exija que a leitura seja feita dentro do
apartamento. O grande diferencial é transmitir as informações do hidrômetro
para um ponto central”, sustenta Ferdinando Guerra, consultor para tecnologia
de medição individual e remota da Agência Nacional de Águas (ANA).
Outras
possibilidades de leitura remota são: por telemetria (onde a leitura dos
hidrômetros é transmitida via placa de celular para um banco de dados e daí seguindo
via internet) e por radiofrequência (o hidrômetro emite um sinal de radiofrequência,
captado pela antena de um transmissor de rádio; nesse caso, a leitura pode ser
feita até mesmo de dentro de um carro, na rua em frente ao edifício). Mais
convencional é a leitura do consumo de cada apartamento através de um software.
Nesse caso, é preciso instalar novas fiações ligando os hidrômetros ao
computador instalado na área comum do condomínio. A síndica Selma Bruni
Barbieri optou por esse sistema de instalação. Para conseguir uma significativa
economia de água no condomínio onde é síndica, ela já havia tentado, sem
sucesso, campanhas de reeducação para o uso consciente da água. “Os moradores
me diziam que estavam economizando mas eu não via resultados na conta”, lembra.
Selma
tinha, no entanto, um problema para concretizar a medição individualizada. Cada
um dos 18 apartamentos do edifício tem sete prumadas de água. “Foi aprovado em
assembléia que faríamos a individualização de três pontos que, juntos, representam
cerca de 70% do consumo de cada apartamento. São as prumadas da água quente, da
lavanderia e banheiro de empregada e da cozinha”, conta Selma. O consumo das
bacias, da água fria e do lavabo não foi individualizado e continua sendo
rateado entre os apartamentos. Como o prédio foi construído há seis anos, já
possui as bacias com caixas acopladas mais econômicas, que consomem apenas seis
litros. Com a individualização, Selma consegue acompanhar, através da leitura
mensal que ela mesma faz, se o consumo dos apartamentos está dentro da média.
“Certa vez, apenas um ponto de um apartamento detectou 90 m3 de consumo. Era um
problema no sensor eletrônico, que logo foi sanado”, conta.
Mas,
quando se trata de individualização o que mais preocupa os síndicos é o
transtorno causado pela instalação dos hidrômetros nos apartamentos. “O grande
desafio da individualização nos prédios antigos é a obra hidráulica, pois é
preciso unificar as prumadas”, explica Ferdinando Guerra, da ANA. Para o
engenheiro João Martani, que há cinco anos trabalha com individualização em
condomínios, não há possibilidade de individualização sem quebra-quebra. “Mesmo
em prédios novos, muitas construtoras deixam o hidrômetro dentro do
apartamento, o que nos obriga a realizar uma obra civil para instalar o
hidrômetro fora. O ideal é que ele fique num local de fácil acesso e
localização para que se realize a leitura”, diz Martani.
O
engenheiro esclarece ainda que, a princípio, todo prédio pode ter sua medição
de água individualizada por unidade condominial. “Há prédios em que, pela forma
como foi construído e pelo projeto hidráulico, o procedimento é favorecido e
facilitado. A complexidade da obra muda conforme as características do prédio”,
aponta. Edifícios com válvulas de descarga, por exemplo, têm um impedimento
para a medição individualizada. “O hidrômetro não dá vazão de água para que a
válvula funcione”, garante Martani. Ele complementa ainda que prédios que, pelo
tempo de construção, necessitam de troca de colunas de água, devem considerar a
possibilidade de realizar a individualização ao invés das substituições das
colunas. “É mais barato individualizar do que trocar as colunas. É colocada uma
tubulação nova e a coluna velha deixa de ter função”, afirma.
Na
opinião do síndico Maurício Jovino, individualizar a conta de água não se trata
do bicho de sete cabeças que muitos administradores imaginam. “É uma obra muito
mais fácil do que diversas outras que os condomínios realizam. É claro que,
conforme o tamanho do prédio, trata-se de uma obra gigantesca onde todo cuidado
é pouco”, esclarece. O próprio Maurício, para contratar a individualização no
condomínio onde é síndico, com sete blocos e 140 unidades, se cercou de todas
as precauções. Ele lembra que foram 11 reuniões para tratar do assunto – com o
conselho, os moradores de cada torre, as empresas consultadas. “Vejo muitos
síndicos se aventurando com empresas despreparadas e depois acabam condenando a
individualização. É preciso pesquisar muito, investir tempo no assunto e
escolher uma empresa séria, que dê garantia e tenha um engenheiro responsável”,
resume. Feito o serviço, surge ainda a questão de quem realizará a medição.
Maurício é favorável a terceirizar essa tarefa para uma empresa especializada,
geralmente a mesma que instalou o sistema: “É preferível do que querer
economizar com uma taxa que cobre inclusive uma eventual assistência técnica.”
Maurício
dedicou um ano estudando o tema: foi a workshops, palestras, visitou síndicos
que já tinham individualizado, consultou advogados. Hoje, quase três anos
depois, ele não poderia estar mais satisfeito com o resultado. A conta de água,
que chegou a R$ 8 mil a três anos, hoje está em R.800. “A individualização gera
economia porque dói no bolso e também porque é possível detectar vazamentos
rapidamente”, avalia. Para Maurício, a conta individual também traz justiça. No
seu caso, há apartamentos de dois e três dormitórios no condomínio. “O de três
pagava mais água, mas nem sempre tinha mais moradores”, completa. Outro detalhe
que Maurício considera essencial: sempre aprovar a obra de individualização de
água em assembleia, com 2/3 de quorum.
Cortar ou não cortar, eis a questão.
Além
do custo que a conta de água significa para o condomínio, outro atrativo tem
movido muitos síndicos para a obra da medição individualizada de consumo: a
possibilidade de corte da água dos inadimplentes. Muitos acreditam que basta
atualizar a convenção do condomínio para legalizar o corte, e discriminar a
despesa com água separadamente no próprio boleto do condomínio, economizando
com a emissão de um novo boleto.
Há
opiniões que julgam a questão um pouco mais complicada. Para o advogado e
consultor jurídico condominial Cristiano De Souza Oliveira, a partir do momento
em que o condomínio passa a administrar a leitura da água e intermediar o
serviço, podendo cortar o consumo, muda a relação jurídica entre condomínio e
condômino para uma relação de consumo, portanto regida pelo Código de Defesa do
Consumidor. “Pelo Código, o consumidor tem direito de escolher a data do pagamento.
Recomendo, portanto, que a água seja cobrada separadamente e que o corte seja
feito com autorização judicial”, diz.
Outro
aspecto levantado por Cristiano é quanto a característica de parte comum dada à
rede de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, segundo o artigo
1331, parágrafo 2º do Código Civil. “Se a rede de distribuição de água é parte
comum, não há o que se falar em corte, pois é propriedade do condômino, ainda
que possua deliberação em assembleia ou definição na convenção condominial”,
afirma.
Para Cristiano, todos os cuidados devem ser tomados para que o
condomínio não seja lesado, no caso de contestação e até mesmo ação judicial
por perdas e danos pelo condômino inadimplente. “Inadimplência e proibições de
uso ou corte de consumo são situações diversas. Aconselho o condomínio a levar
o caso ao Poder Judiciário, cobrando a dívida judicialmente e requerendo, em
caráter liminar ou de tutela antecipatória, o corte de consumo”, justifica.
Fonte: Revista Direcional Condomínios
RENASCER
ADMINISTRAÇÃO CONDOMINIAL
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