segunda-feira, 14 de abril de 2014

Individualização de hidrômetro e a economia de água

               O assunto nunca esteve tão em pauta entre síndicos, administradores e condôminos. Na busca pela economia na conta de água, a medição do consumo por unidade tem sido a saída adotada por muitos condomínios.

                O consumo de água é um dos maiores vilões do condomínio. Na verdade, a conta de água representa a segunda maior despesa dos condomínios, só perdendo para a folha de pagamento somada aos encargos e obrigações trabalhistas. Além de pesar no bolso, o gasto excessivo de água deve ser combatido por representar uma questão de sobrevivência da humanidade. Não faltam dados para mostrar que a água é um bem finito. Segundo um relatório coordenado pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura), se medidas urgentes não forem tomadas para implementar o uso racional dos recursos hídricos, até 7 bilhões de pessoas poderão conviver com a falta de água no ano 2050. Como resolver essa triste equação?

                Para Aurélio Nomura, vereador da cidade de São Paulo, são essenciais o incentivo à economia e ao reuso da água, o aumento da captação da água de chuva e a ampliação da rede de tratamento de esgoto. Ele também acredita, porém, que a medição individualizada em condomínios é um dos caminhos para solucionar a crise no abastecimento de água. “Ela é perfeitamente viável inclusive nas construções antigas. Um levantamento da Agência Nacional de Águas estipula o retorno do investimento entre 10 a 24 meses”, afirma. Aurélio é o autor da Lei 14.018/2005, já aprovada mas não regulamentada, que institui em São Paulo o Programa Municipal de Conservação e Uso Racional da Água em Edificações. A lei prevê a instalação de hidrômetros individuais nas unidades das edificações novas e dá um prazo de 10 anos para as construções antigas se adequarem. São Paulo, assim, acompanha cidades como Recife, Vitória, Niterói e Curitiba, que já têm suas legislações sobre o assunto.

                Nomura enumera alguns dos resultados obtidos em prédios que optaram pela individualização: redução da despesa de água e de energia elétrica (já que diminui o volume de água a ser bombeado no prédio), melhor possibilidade de identificação de vazamentos, redução da inadimplência e do volume de esgoto produzido pelo prédio. Em prédios novos, ainda segundo o vereador, um projeto hidráulico prevendo a medição individualizada pode economizar até 25% no custo da construção.

                Em São Paulo, prédios recém-entregues na Mooca pela CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano) dispõem de medição individualizada de água, energia e gás pela tecnologia PLC (Power Line Comunication). Além da medição dos consumos, essa tecnologia permite que sinais de telefonia digital, TV a cabo e internet caminhem pela rede elétrica. “Hoje a leitura da água é feita a distância, na Eletropaulo. Não há necessidade de entrar um leiturista no prédio”, afirma Raphael Pileggi, secretário executivo do Qualihab, comitê de qualidade da CDHU, completando que o sistema representou uma economia de 16% no custo da instalação elétrica dos edifícios.

                O sistema PLC é uma das tecnologias mais inovadoras quando se trata de medição individualizada de água. As informações dos hidrômetros instalados nos apartamentos são transmitidas pela mesma fiação da rede elétrica a um equipamento instalado na área comum. “Os sistemas de medição remota, como o PLC, diminuem um grande problema da individualização, que é o da leitura. Não adianta instalar um hidrômetro que exija que a leitura seja feita dentro do apartamento. O grande diferencial é transmitir as informações do hidrômetro para um ponto central”, sustenta Ferdinando Guerra, consultor para tecnologia de medição individual e remota da Agência Nacional de Águas (ANA).

                Outras possibilidades de leitura remota são: por telemetria (onde a leitura dos hidrômetros é transmitida via placa de celular para um banco de dados e daí seguindo via internet) e por radiofrequência (o hidrômetro emite um sinal de radiofrequência, captado pela antena de um transmissor de rádio; nesse caso, a leitura pode ser feita até mesmo de dentro de um carro, na rua em frente ao edifício). Mais convencional é a leitura do consumo de cada apartamento através de um software. Nesse caso, é preciso instalar novas fiações ligando os hidrômetros ao computador instalado na área comum do condomínio. A síndica Selma Bruni Barbieri optou por esse sistema de instalação. Para conseguir uma significativa economia de água no condomínio onde é síndica, ela já havia tentado, sem sucesso, campanhas de reeducação para o uso consciente da água. “Os moradores me diziam que estavam economizando mas eu não via resultados na conta”, lembra.

                Selma tinha, no entanto, um problema para concretizar a medição individualizada. Cada um dos 18 apartamentos do edifício tem sete prumadas de água. “Foi aprovado em assembléia que faríamos a individualização de três pontos que, juntos, representam cerca de 70% do consumo de cada apartamento. São as prumadas da água quente, da lavanderia e banheiro de empregada e da cozinha”, conta Selma. O consumo das bacias, da água fria e do lavabo não foi individualizado e continua sendo rateado entre os apartamentos. Como o prédio foi construído há seis anos, já possui as bacias com caixas acopladas mais econômicas, que consomem apenas seis litros. Com a individualização, Selma consegue acompanhar, através da leitura mensal que ela mesma faz, se o consumo dos apartamentos está dentro da média. “Certa vez, apenas um ponto de um apartamento detectou 90 m3 de consumo. Era um problema no sensor eletrônico, que logo foi sanado”, conta.

                Mas, quando se trata de individualização o que mais preocupa os síndicos é o transtorno causado pela instalação dos hidrômetros nos apartamentos. “O grande desafio da individualização nos prédios antigos é a obra hidráulica, pois é preciso unificar as prumadas”, explica Ferdinando Guerra, da ANA. Para o engenheiro João Martani, que há cinco anos trabalha com individualização em condomínios, não há possibilidade de individualização sem quebra-quebra. “Mesmo em prédios novos, muitas construtoras deixam o hidrômetro dentro do apartamento, o que nos obriga a realizar uma obra civil para instalar o hidrômetro fora. O ideal é que ele fique num local de fácil acesso e localização para que se realize a leitura”, diz Martani.

                O engenheiro esclarece ainda que, a princípio, todo prédio pode ter sua medição de água individualizada por unidade condominial. “Há prédios em que, pela forma como foi construído e pelo projeto hidráulico, o procedimento é favorecido e facilitado. A complexidade da obra muda conforme as características do prédio”, aponta. Edifícios com válvulas de descarga, por exemplo, têm um impedimento para a medição individualizada. “O hidrômetro não dá vazão de água para que a válvula funcione”, garante Martani. Ele complementa ainda que prédios que, pelo tempo de construção, necessitam de troca de colunas de água, devem considerar a possibilidade de realizar a individualização ao invés das substituições das colunas. “É mais barato individualizar do que trocar as colunas. É colocada uma tubulação nova e a coluna velha deixa de ter função”, afirma.

                Na opinião do síndico Maurício Jovino, individualizar a conta de água não se trata do bicho de sete cabeças que muitos administradores imaginam. “É uma obra muito mais fácil do que diversas outras que os condomínios realizam. É claro que, conforme o tamanho do prédio, trata-se de uma obra gigantesca onde todo cuidado é pouco”, esclarece. O próprio Maurício, para contratar a individualização no condomínio onde é síndico, com sete blocos e 140 unidades, se cercou de todas as precauções. Ele lembra que foram 11 reuniões para tratar do assunto – com o conselho, os moradores de cada torre, as empresas consultadas. “Vejo muitos síndicos se aventurando com empresas despreparadas e depois acabam condenando a individualização. É preciso pesquisar muito, investir tempo no assunto e escolher uma empresa séria, que dê garantia e tenha um engenheiro responsável”, resume. Feito o serviço, surge ainda a questão de quem realizará a medição. Maurício é favorável a terceirizar essa tarefa para uma empresa especializada, geralmente a mesma que instalou o sistema: “É preferível do que querer economizar com uma taxa que cobre inclusive uma eventual assistência técnica.”

                Maurício dedicou um ano estudando o tema: foi a workshops, palestras, visitou síndicos que já tinham individualizado, consultou advogados. Hoje, quase três anos depois, ele não poderia estar mais satisfeito com o resultado. A conta de água, que chegou a R$ 8 mil a três anos, hoje está em R.800. “A individualização gera economia porque dói no bolso e também porque é possível detectar vazamentos rapidamente”, avalia. Para Maurício, a conta individual também traz justiça. No seu caso, há apartamentos de dois e três dormitórios no condomínio. “O de três pagava mais água, mas nem sempre tinha mais moradores”, completa. Outro detalhe que Maurício considera essencial: sempre aprovar a obra de individualização de água em assembleia, com 2/3 de quorum.

Cortar ou não cortar, eis a questão.

                Além do custo que a conta de água significa para o condomínio, outro atrativo tem movido muitos síndicos para a obra da medição individualizada de consumo: a possibilidade de corte da água dos inadimplentes. Muitos acreditam que basta atualizar a convenção do condomínio para legalizar o corte, e discriminar a despesa com água separadamente no próprio boleto do condomínio, economizando com a emissão de um novo boleto.

                Há opiniões que julgam a questão um pouco mais complicada. Para o advogado e consultor jurídico condominial Cristiano De Souza Oliveira, a partir do momento em que o condomínio passa a administrar a leitura da água e intermediar o serviço, podendo cortar o consumo, muda a relação jurídica entre condomínio e condômino para uma relação de consumo, portanto regida pelo Código de Defesa do Consumidor. “Pelo Código, o consumidor tem direito de escolher a data do pagamento. Recomendo, portanto, que a água seja cobrada separadamente e que o corte seja feito com autorização judicial”, diz.

                Outro aspecto levantado por Cristiano é quanto a característica de parte comum dada à rede de distribuição de água, esgoto, gás e eletricidade, segundo o artigo 1331, parágrafo 2º do Código Civil. “Se a rede de distribuição de água é parte comum, não há o que se falar em corte, pois é propriedade do condômino, ainda que possua deliberação em assembleia ou definição na convenção condominial”, afirma. 

Para Cristiano, todos os cuidados devem ser tomados para que o condomínio não seja lesado, no caso de contestação e até mesmo ação judicial por perdas e danos pelo condômino inadimplente. “Inadimplência e proibições de uso ou corte de consumo são situações diversas. Aconselho o condomínio a levar o caso ao Poder Judiciário, cobrando a dívida judicialmente e requerendo, em caráter liminar ou de tutela antecipatória, o corte de consumo”, justifica.
Fonte: Revista Direcional Condomínios

RENASCER ADMINISTRAÇÃO CONDOMINIAL

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